sexta-feira, 31 de agosto de 2012

A primeira viagem


Lembrei-me hoje da primeira “grande” viagem que fiz. Aquela viagem a sério, muito desejada, para fora do país: Foi há 15 anos e fui sozinho. Paris (10 dias), Bordéus (2 dias) e S. Sebastian (2 dias) foram os destinos. Planeei aqueles dias da seguinte forma: tratei das viagens e da respectiva reserva de lugar para o comboio e o resto logo se veria como ia ser quando chegasse. E foi muito bom decidir o destino da viagem numa conversa com companheiros de compartimento, que nunca mais vi. A estadia foi sendo decidida à medida que os dias iam passando.

Daí em diante, a abordagem às minhas viagens tem sido sempre a mesma: descubro os locais quando chego, embora uma vez por outra tenha lido alguns livros ou visto filmes em cuja acção se desenrola nos locais para onde antecipadamente sei que vou. Raramente há guias de viagem e quando os levo, só os abro para procurar alojamento e apenas quando estou já a caminho do destino escolhido.

Não há nada mais excitante do que viajar ao sabor do vento, estando sujeito às influências das pessoas que vamos encontrando e dos lugares por onde vamos passando.

Viajar sem planos significa igualmente que corremos mais riscos, principalmente o risco de nos perdermos e isso vai representar uma série de possibilidades de encontrar coisas novas e completamente inesperadas.

Penso que se fizermos itinerários detalhados, acabamos por retirar toda a emoção da viagem. É muito provável que nos desapontemos por não termos ido a determinado local que alguém que encontrámos nos indicou ou que descobrimos que valia a pena visitar, só para não alterar os nossos planos. Se definirmos bem onde ir e o que fazer, acabamos por perder no caminho que definimos, os imprevistos que estão subtilmente à nossa procura ou à nossa espera, no caminho ao lado.

As viagens tornam-se verdadeiramente inspiradoras se formos construindo a cada momento, o nosso próprio itinerário.

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

De viagem


Abraçavam-se os quatro e choravam. Pedro estava de partida para o país que o tinha acolhido há uns anos. Seria mais um ano de saudade, que os pais e o irmão tentariam atenuar de todas as formas possíveis. 

Até ao fim do dia, esta é uma cena que se repetirá muitas outras vezes, com outros intérpretes, com a mesma intensidade. O aeroporto é o local de partidas para tantos destinos. Alguns, de regresso ao local que passaram a chamar casa, já cheios de saudade dos que ficam e do que fica. Os abraços tardam a desfazer-se. 

Desci as escadas. Muitos abraços. Felizes pelo regresso: "ainda bem que voltaste".

O ambiente nas chegadas, contrasta com a dor da despedida. A alegria e a tristeza, lado a lado, no mesmo espaço. 

Continuo a caminhar e saio dali.

Chegar e partir são os dois lados da mesma viagem.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Amizade à segunda vista

Os meus amigos têm sempre a gentileza de me apresentarem aos amigos deles. Em muitos casos, essas pessoas passaram a ser apenas minhas conhecidas, outras, uns dias depois, desconhecidas e outras de quem fiquei amigo, dada a intensidade da primeira impressão. É assim que as coisas se passam comigo e com toda gente. Não há espaço para "albergar" toda gente na nossa vida nem para sermos "albergados" na vida de outras pessoas e acabamos a seleccionar ou a ser seleccionados...

Hoje fui jantar com uma dessas pessoas, que conheci há pouco mais de um ano e com quem não voltei a falar até há uns meses. O rugby aproximou-nos e firmou uma amizade que tinha ficado em suspenso. Esta amizade enriquecedora, basta-se a si própria. Não há motivos para sermos amigos, mas temo-nos como bons amigos.

Quando regressava a casa pensei nisso e nas diversas formas como os meus amigos apareceram na minha vida. No caso do Nuno, não ficámos amigos. Encontrámo-nos.

sábado, 25 de agosto de 2012

A dor que veio de Nottingham


Costumava ir à Roma Megastore do Porto, junto à Rua de Santa Catarina, para ver a música que se editava e que nem sempre tinha destaque nos jornais. Os funcionários da loja eram excelentes conhecedores de discos (penso talvez até fizessem as encomendas da loja segundo os seus gostos pessoais) e davam sempre óptimas “dicas” sobre os melhores álbuns de cada género. Conheci vários grupos e álbuns por causa deles.

Numa dessas "visitas", encontrei, por acaso, um álbum com rosas na capa. Peguei no CD, observei-o e trouxe-o comigo. Era a época em que eu comprava CDs por causa das capas. Tive sempre muita sorte com o que comprei. Desta vez, era o terceiro álbum dos Tindersticks.

Cheguei a casa e fui ouvir aquele “Curtains”: “Greed's all gone now, there's no question”, sussurrava a voz intimista de barítono do Stuart Staples, que me deixou imediatamente cativo.

A música dos Tindersticks é um estado de tensão constante e sem libertação possível. Até eles, ninguém tinha composto uma banda sonora tão boa para os dias tristes e vazios, para as relações falhadas, para os estados de alma com fracturas expostas, para as misérias e infortúnios humanos. Não é que eles façam música triste. Não é isso. Apenas fazem música com um travo sombrio e um romantismo mais amargo.

A música do “Curtains” é de uma beleza delicada e difícil de descrever. As cordas do violoncelo surgem sempre como lâminas que nos golpeiam a alma, expondo-nos à realidade da incompreensão mútua das relações terminadas e ao vazio a que nos conduz o afastamento entre dois seres que se desencontraram. A orquestração teatral e a voz melodramática de Stuart Staples deslizam em canções hipnóticas, que exploram o que há de mais íntimo em nós.

Os Tindersticks têm um charme inexplicável e fizeram, de forma elegante, “Curtains”, que é um disco intencionalmente superlativo e marcante. Maravilhoso, sem dúvida.

O meu dia termina ao som de Tindersticks. Não há medo de ressacas.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Somewhere

Hoje, ao regressar a casa, fui rever o filme "Somewhere", da Sofia Coppola e senti-me sozinho ao ver tanta solidão. Foram 90 minutos de vazio, que terminam com a aparente libertação do actor principal. A questão que o filme coloca é, no fundo, saber se nos libertamos ou não...

A verdade é que não me surpreendo que o filme acabe e eu tenha ficado com uma angústia que me sabe bem por perceber que é nos momentos de maior isolamento que as pessoas transitam de uma vida superficial e evoluem.


De facto, ter alguém que nos espera em algum lugar é o que de mais extraordinário a vida nos dá.