domingo, 19 de maio de 2013

Um amor incondicional


Há muitas formas de olhar para "o futebol". Em quase todas, há largas doses de irracionalidade, incoerência e até mesmo estupidez. Reconheço que me é muito difícil conseguir falar de futebol, sem ser tendencioso. Faz parte da minha natureza, como faz parte o enorme optimismo que costumo carregar. Acredito que o FCPorto é o melhor clube português e nem sequer aceito entrar nessa discussão, por ser desnecessária. Acredito que vai ganhar sempre, mesmo quando a segundos do apito final do árbitro, o resultado nos é completamente desfavorável.

Quem me conhece, sabe que apenas gosto do meu clube e que lhe devoto um amor enorme e incondicional. Nada noutros clubes me desperta qualquer tipo de sentimento. Não consigo ter qualquer prazer numa má prestação de outro clube ou num golo que marquem numa competição internacional. É-me indiferente o que lhes acontece, porque sou daqueles que pensa que o FCPorto pode ganhar todos os jogos, por cinco a zero, no mínimo e assim, ganharmos tudo.

Sou Portista desde que nasci e tenho pelo meu clube um amor incondicional. Sou Portista nos momentos bons e nos momentos em que o meu clube não me dá nada em troca, perdendo.

Nos últimos dias, li em todo o lado, frases de gozo a outros clubes, porque perderam competições perto do final ou porque conseguiram a pior classificação de sempre. No fundo, porque falharam os objectivos a que se propuseram há 10 meses atrás. Não é essa a minha postura, porque sei bem que o futebol, para além da paixão e dos resultados que me devolve, é também um jogo altamente traiçoeiro e talvez por isso, tão sedutor.

Os meus irmãos apoiam o Sporting e o Benfica e esta foi uma época dura para ambos. Fui incapaz de os gozar a eles ou a qualquer pessoa que sinta como eles, embora no fundo, espere que nos próximos cinquenta anos, o meu clube ganhe tudo o que houver para ganhar, o que implica que os meus irmãos (e muitos amigos meus) continuem sem festejar grande coisa.

Estes momentos de vitória deixam-me sempre emocionado. Muito emocionado, porque sei qual é o reverso da medalha. Hoje é dia de festa porque ganhámos o vigésimo sétimo Campeonato Nacional, mantendo a hegemonia que se conquistou nas últimas décadas. O título conquistado hoje é ainda mais valorizado pela época extraordinária que o Benfica fez.

Tenho-me lembrado muito de quando eu era um miúdo que ia às Antas ver futebol. Saía cedo da minha aldeia, e ia sozinho rumo ao Porto, movido apenas pela paixão e pela esperança de mais uma vitória. Nesses tempos, era muito difícil, para mim, ser Portista.

Agora, tenho muitos amigos cujo coração veste de Azul e Branco. Nem sempre estamos de acordo, temos muitas vezes visões diferentes acerca do que se passa em campo e fora dele, mas é maravilhoso que estejamos unidos neste sentimento comum de amor ao nosso Clube. 

Neste momento especial, é neles que penso e é a eles que deixo o maior dos meus abraços. 

quinta-feira, 21 de março de 2013

Vamos perpetuar

Porque é que as relações amorosas hão-de ser algo efémero, frágil, votado ao fracasso? Porque é que hão-de todas de obedecer às mesmas regras inflexíveis? Será o amor uma ciência matemática Infalível?

Não há aqui um denominador comum!

Já assisti a um vasto número de relacionamentos, de todo o tipo e que envolviam pessoas diversas, distintas, multifacetadas. Vi relações que terminaram logo na semana seguinte a terem começado, namoros que se prolongaram penosamente por meses para grande agonia das partes, namoros que duram com grande estabilidade e solidez há anos. Não há uma só verdade, uma só realidade, uma só fórmula, um só desfecho.

Acredito na relativa perpetuidade dos sentimentos, acredito que é possível lançar as sementes que gerarão um relacionamento, solidificá-lo, apaparicá-lo e conseguir que tal realidade se perpetue por um período de tempo considerável! Tudo depende do empenho das partes envolvidas e da perspectiva que estas possuem.

É necessário acreditar, por muito irrealista que possa parecer!

quarta-feira, 20 de março de 2013

Sessenta e sete

Depois de um dia sem nada que o distinguisse dos outros, juntaram-se os filhos e a mulher para lhe desejar "muitos anos de vida". Aquele era um dia frio, que nos lembrava que apesar de estarmos já às portas da primavera, o inverno estava ainda vigoroso. Eram os encontros em família que tornavam menos dolorosos os dias sucessivos passados no hospital.

Aquele homem, agora frágil, reagia com indesfarçável alegria à presença da sua família e estava feliz por completar 59 anos, embora já se conseguisse detectar nele, aquele olhar perplexo e magoado que têm os que sabem que vão partir em breve, sem que nada possa ser feito para o evitar. 

Demasiado cedo para se lembrar, perdeu a mãe. Mais tarde, a vida levou-lhe primeiro o pai e depois, à vez, dois dos seis irmãos. Viveu a guerra, ultrapassou a morte de amigos chegados e de camaradas de armas. Sofreu desgostos, fracassos e tristezas e talvez por isso amasse com a frieza de uma rocha. Apesar da dureza de muitas perdas e faltas de afecto, estava lá sempre, para tudo. Não era um homem vulgar e, embora não parecesse, era muito atento a tudo. Não censurava o desaire nem enaltecia a vitória. O seu percurso de vida tornou-o um pouco austero nos afectos.

Os últimos meses haviam revelado um homem que, sem o dizer, mostrava sentir que aquela família era tudo na sua vida. Construiu-a com os meios que tinha, impondo a honestidade, o respeito e a generosidade como princípios básicos.

Se fosse vivo, completaria hoje sessenta e sete anos.

Em muitos dias dos últimos anos senti a saudade que a sua ausência definitiva nos deixou. Hoje, ao acordar, lembrei-me dele e de que tenho muitas coisas para lhe dizer.

Quase sem que eu desse conta, no silêncio desta manhã, enquanto me olhava ao espelho, colocando a vida em perspectiva, saiu-me um "obrigado, Pai".

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Dois mil e doze

Tenho o hábito de reflectir sobre a minha vida e estabelecer objectivos em Outubro. Hoje, talvez contagiado por tantos balanços feitos por estes dias, decidi fazer aqui um (muito incompleto) balanço daquilo que foi para mim de dois mil e doze, um ano que comecei e terminei junto da minha família.

O José, por tudo e mais alguma coisa.

Reencontrei amigos, perdi pessoas, morreu gente que eu conhecia desde que nasci e pessoas que eu não conhecia (e morreu a Chavela Vargas, que era a minha cantora favorita).

De entre todos os que chegaram e partiram, destaca-se a generosa e incondicional amizade do Nuno Costa.


Magoei-me fisicamente várias vezes e fiquei triste muito poucas... Entre pés partidos, luxações, entorses, feridas, sangue no nariz e na testa, traumatismos e coisas que não me recordo, fica a sensação de que aguento mais do que penso...

Joguei rugby em muitos sítios e marquei alguns ensaios que ajudaram a minha equipa a ganhar jogos. Fiz provas de atletismo, joguei futebol entre amigos, fiz natação muitas vezes (sozinho), mas o meu desporto favorito ainda é "dar abraços".

Trabalhei motivado e grato por ter trabalho.

Viajei em Portugal e pela Europa. Estive em sítios que não conhecia e descobri sítios que conhecia bem, mas que ainda têm muito para revelar. De todos, continuo a pensar que onde me sinto melhor é na minha aldeia.

Dancei, vi filmes excelentes ("Tabu", de Miguel Gomes, o melhor) e filmes péssimos. Fui ao teatro, ao bailado, a concertos, vi exposições, fiz caminhadas, vi ranchos folclóricos, fui a festas e festejei muito. Descobri artistas novos e consagrados.

Entre tantos jantares e almoços de família e amigos, percebi que quase ninguém cozinha pior que eu (e a Bimby é que me salva).


Lutei, competi, superei-me, ambicionei, conquistei, elevei a fasquia, ganhei, perdi e tive sempre muita esperança.

Amei muito e fui ainda mais amado, porque só uma vida de amor pode valer a pena.

Esta manhã, quando acordei, pensei que em dois mil e doze, adormeci todos os dias feliz e é por isso que dois mil e doze valeu a pena.

Em vez de pedir um bom ano de dois mil e treze, farei os possíveis para ser uma pessoa melhor... estou certo que esse será o meu melhor contributo para um ano feliz.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

A saída

De cada vez que deixo a minha aldeia rumo a Lisboa, aumenta a falta que aquele chão me faz. Em nenhum outro sitio me sinto tão em paz como ali. Há pessoas que me conhecem desde que nasci, que me tratam com enorme respeito, quando são essas pessoas, alvo da minha maior admiração.

Saí da minha aldeia há 17 anos. Saí porque tinha definido um rumo para a minha vida e queria concretizá-lo. Há pessoas que decidiram ficar ali para sempre. Pensei que era por serem menos ambiciosos do que eu.

Descubro a cada visita, que era na minha aldeia que eu devia ter sempre ficado. É lá que me descubro e que me descobrem. É ali que encontro quem me abraça e sorri tão genuinamente ao ver-me.

Há pessoas que, por velhice, foram obrigadas a sair de suas casas para serem internadas em lares de idosos. Ao ouvi-los, descubro-lhes a mágoa desse abandono forçado e penso no meu, voluntário e ambicioso.

Quantos mais dias passam, mais perto estou de regressar à minha aldeia e ao convívio diário com quem me quer tão bem, sem outro interesse que não o meu bem-estar.

Se mais razão não houvesse, bastar-me-iam as lágrimas emocionadas de pessoas que me pegaram tantas vezes ao colo e que hoje, quase sem forças para se levantarem e caminharem, ainda me abraçam, firmes, com pena de mais uma despedida.

Eu vou voltar.


quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Pelo colectivo

Um destes dias fui assistir a uma noite de fados numa colectividade de uma pequena aldeia do concelho de Tomar.

Era tudo amador (até pelo facto de todos amarem o que fazem). Os músicos e os fadistas eram de lugares próximos e ensaiavam em segundos, no palco antes de cada actuação. Cada um deu o que tinha: Uns, a voz, outros os dedilhados nas cordas das violas e da guitarra.

Na cozinha, as mulheres atarefadas à volta da panela, preparam o caldo verde que vai ser servido no primeiro intervalo. A couve portuguesa, as batatas, o azeite e o chouriço foram também oferecidos. Alguém trouxe uns garrafões de agua-pé e bebe-se devagar, enquanto se chora a dor e a saudade no palco.

Com pequenos gestos de cada um, a um preço simbólico, mais de cinquenta pessoas ouvem fado e aquecem o corpo e a alma numa noite gelada, algures no "país real".

É em pequenas colectividades como aquela, que se decide e consegue a alegria de uma comunidade em partilha. Cada um trabalha gratuitamente ou oferece o que tem, pelo bem comum e pela cultura da gente da terra.

Por algumas horas, todos felizes.

É hora de recordar. Fernando Maurício é o primeiro.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Salvação, mas pouco

Eu e os meus irmãos temos a veleidade de salvar o país de duas em duas semanas, quando nos encontramos em casa dos meus pais. Discutimos sempre com muita intensidade na defesa do modelo que, acreditamos, irá tornar Portugal na maior potência europeia, rivalizando até com o Japão e com os EUA.

Raramente concordamos nos argumentos, falamos alto, por cima uns dos outros, muitas vezes sem sequer dar tempo de resposta ou pensarmos bem antes de dizermos os disparates que tantas vezes dizemos quando as posições se extremam.

Enquanto o meu pai esteve connosco, ocupando sempre o topo da mesa, tínhamos o cuidado de moderar as conversas, até no sentido de que ele tomasse partido por um de nós, encerrando a conversa.

Agora, é praticamente impossível à minha mãe conseguir algum consenso nesta "família à italiana" com três filhos adeptos (fanáticos) de três clubes diferentes, com três defensores de soluções politicas diferentes e até com olhares díspares sobre religião. No entanto, quando as coisas estão prestes a azedar, há sempre uma das maravilhosas sobremesas que ela nos prepara. Enterram-se os machados de guerra e aguarda-se por nova batalha dali a duas semanas.

De barriga cheia, entretemo-nos então a falar da nossa vida e das nossas coisas. Cada um de nós deseja um mundo melhor para os outros dois e é por isso que discutimos sempre sobre o estado das coisas.

Antes de salvar o mundo todo, queremos salvar o mundo dos outros dois. É por isso que vejo os meus irmãos como super-heróis. 

Adoramos discutir e isso é o sal da vida.