segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Para o Porto

Acordou cerca da hora de almoço, já com pouco tempo para tudo. Na véspera houve uma pequena festa de despedida. Reparou que tinha um embrulho em cima de uma das quatro malas prontas a fechar. Era "O Papalagui", com uma dedicatória.

Levantou-se ainda ensonado, e foi para o banho. Seguiu-se o habitual almoço de Domingo, em família, desta vez quase silencioso. Aquela partida era pouco desejada pelos pais, mas inevitável. Havia a certeza de um mundo melhor à espera. A ilusão do sucesso estava mesmo ali. Explicar isso a quem nos quer por perto não seria fácil para ninguém.

Ao início da tarde, começaram as despedidas. Era só um "até já" porque "o Porto é já ali e eu venho muitas vezes". Repetiu isso vezes sem conta por entre os vizinhos que ia encontrando, como que precisando dessa repetição para acreditar no que estava a dizer.

O abraço demorado da mãe foi o último antes de entrar no comboio. Nunca saberei o que custa a um pai ou a uma mãe, o momento da despedida. Aquele momento em que se sabe que a cria, ainda tão imatura, já insiste em caminhar apenas pelo seu próprio pé e já se sente dono de todas as certezas do mundo, deixando para trás a casa de sempre. O lar.

O olhar da mãe, que atravessava os vidros da janela da carruagem, era chuvoso como aquela tarde fria de Dezembro. Por um segundo, teve vontade de voltar e desistir de tudo. Mas sorriu e acenou uma vez mais.

Lentamente o comboio parte com destino ao Porto. O caminho era para preparar definitivamente o coração para o realizar do maior sonho: viver no Porto. Tinha chegado o primeiro dia.

A aventura começava e, apesar da tristeza que tinha deixado lá atrás, não havia maior sorriso do que aquele que o seu rosto transportava. Estava feliz por ter conseguido.


Passam hoje 17 anos que deixei aos bocados o coração dos meus pais. Há 17 anos, cheguei ao Porto carregado de sonhos e de esperanças. Aquela cidade tornou-se, em pouco tempo, a minha segunda casa. Aquela gente hospitaleira e genuína, passou a ser parte da minha enorme família.

Provavelmente não voltarei a viver no Porto, mas recordarei os anos que lá vivi como o melhor tempo da minha vida. 

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